DPU aponta inconstitucionalidade em resolução sobre rol máximo para planos de saúde

DPU destaca que ANS extrapolou limites do poder regulamentador.
DPU destaca que ANS extrapolou limites do poder regulamentador.

Em Nota Técnica, a Defensoria Pública da União (DPU) aponta que a Agência Nacional de Saúde (ANS) violou preceitos fundamentais da Constituição Federal ao estabelecer um rol máximo, taxativo, de procedimentos e eventos em saúde. Na prática, por meio de resolução (465, de 2021), a autarquia determinou que operadoras de planos de saúde não estão obrigadas a custear procedimentos não previstos na lista de cobertura.

O texto também destaca que a medida extrapolou os limites do poder regulamentador da autarquia. A finalidade institucional da ANS é promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no país (art. 3º, da Lei n. 9.961/2000).

“Logo, sob pena de desviar-se dos seus pressupostos de constituição, não pode a ANS editar regulamentação que atente contra o interesse público, sendo este representado na proteção dos consumidores, os quais correspondem à parte vulnerável nas relações de consumo com as operadoras de planos de saúde”, diz a nota.

O documento leva a assinatura do secretário-geral de Articulação Institucional e defensor público federal Gabriel Travassos, do defensor nacional de Direitos Humanos André Porciúncula e do membro do Grupo de Trabalho Saúde da DPU Sérgio Armanelli.

“A previsão do rol taxativo de procedimentos que deveriam ser considerados como referência básica pela ANS – e a limitação do acesso de usuários de planos de saúde a procedimentos médicos que desta decorre – caracterizam vulneração do direito à vida, do direito à saúde e da dignidade da pessoa humana. Desequilibra, ainda, a relação consumerista estabelecida entre a parte hipossuficiente, os consumidores, e os planos de saúde”, explicam os defensores públicos federais.

O texto ainda destaca que o Brasil possui aproximadamente 50 milhões de pessoas usuárias dos planos de saúde. “A manutenção de um rol taxativo de medicamentos, associada à lentidão dos processos administrativos de análise e aprovação de procedimentos, está acarretando a interrupção imediata do tratamento de milhões de pessoas e, em casos graves, a morte de pacientes. De acordo com o Conselho Nacional de Saúde, a manutenção desse quadro pode culminar na morte de muitos beneficiários e beneficiárias”, aponta o texto do documento.

A Nota Técnica ainda cita exemplos de como a determinação afeta diretamente a população, como nos casos de pessoas autistas ou mulheres que precisam realizar mamoplastia, procedimentos que não estão incluídos no rol taxativo da ANS, previsto no Anexo I, da Resolução n. 465/2020.

“Da mesma maneira, diversos tratamentos oncológicos não estão previstos no rol taxativo e, no atual cenário, os pacientes não terão tempo de aguardar a inclusão dos procedimentos. Tal circunstância acarreta risco imediato e grave à vida e, por via oblíqua, irá sobrecarregar o Sistema Único de Saúde, provocando um teratológico quadro no qual o sistema público suportará o ônus financeiro da chancela do comportamento abusivo de operadoras da saúde complementar”, exemplificam os defensores.

Participação em audiência pública

Na Nota Técnica, a DPU também solicita participação em audiência pública, a ser realizada nos dias 26 e 27 de setembro, para tratar da amplitude das coberturas de planos de saúde, a metodologia de atualização do rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar e o seu caráter taxativo. A audiência – convocada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator de cinco ações sobre a matéria – tem como objetivo ouvir especialistas e representantes do poder público e da sociedade civil.

Entenda o caso

A Lei 9.656/98 dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde e regulamenta a forma que as operadoras de saúde devem atuar. No entanto, em março de 2022, a Lei 14.307 alterou alguns artigos da Lei 9.656/98 e, em seguida, a ANS publicou a resolução 465/2021, que fixou um rol taxativo de procedimentos. Em junho, a segunda turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao avaliar o tema, considerou que, em regra, a lista da ANS tem caráter taxativo, ou seja, a operadora de plano de saúde não está obrigada a custear procedimentos não previstos.

De acordo com a nota, a Defensoria Pública da União possui legitimidade para atuar no caso como custus vulnerabilis (guardiã dos vulneráveis), considerando que a decisão sobre a natureza jurídica do rol de procedimentos da ANS irradiará efeitos diretos e indiretos sobre bens jurídicos de que são titulares pessoas necessitadas, como é o caso de usuários de planos de saúde na condição de consumidores ou em condição de hipossuficiência econômica.

“O debate gira em torno do equilíbrio econômico-financeiro do sistema suplementar de saúde privada. Ao mesmo tempo, discute-se a preocupação dos usuários de planos de saúde com as omissões existentes no rol e a consequente não abrangência de todos os procedimentos necessários ao tratamento de doenças cobertas – em especial, doenças raras”, destaca trecho da Nota Técnica.

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