
Reportagem de Mariana Sanches, da BBC News Brasil revela que no momento em que o presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL) volta a lançar dúvidas sobre o processo eleitoral, sugerindo que os militares deveriam supervisionar a contagem de votos do pleito presidencial de 2022, a subsecretária de Estado dos Estados Unidos, Victoria Nuland, afirmou em entrevista exclusiva que, no Brasil, “o que precisa acontecer são eleições livres e justas, usando as estruturas institucionais que já serviram bem a vocês (brasileiros) no passado”.
Nuland, responsável por assuntos políticos na diplomacia americana comandada por Antony Blinken, esteve há poucas semanas no Brasil, junto a uma delegação americana de alto nível. Os diplomatas dos dois países trataram, entre outros temas, de cooperação na área de defesa e de agricultura.
Na ocasião, os americanos voltaram a expressar “confiança na democracia brasileira”. Segundo Nuland, no entanto, ela alertou o governo e a oposição sobre o risco de interferência russa nas eleições deste ano.
Candidato à reeleição e em segundo lugar nas pesquisas, Bolsonaro tem feito uma série de comentários sobre supostas fragilidades das urnas eletrônicas, sem apresentar provas, e atacado o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que conduz o processo.
Na semana passada, a agência de notícias Reuters noticiou que, em julho de 2021, o diretor da agência de inteligência americana, a CIA, William Burns, teria advertido assessores diretos de Bolsonaro de que o presidente, que àquela altura já levantava dúvidas sobre a lisura do processo eleitoral, deveria deixar de questionar a integridade das eleições no país.
Tanto Bolsonaro como o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que teria estado presente na conversa, negam que ela tenha acontecido.
Questionada sobre o que os EUA fariam em caso de uma tentativa de golpe no país, Nuland afirmou: “Queremos eleições livres e justas em países ao redor do mundo e, particularmente, nas democracias. Julgamos a legitimidade daqueles que se dizem eleitos com base em se a eleição foi livre e justa e se os observadores, internos e externos, concordam com isso. Então, queremos ver, para o povo brasileiro, eleições livres e justas no Brasil”.
Ao citar observadores externos, Nuland toca indiretamente em mais um ponto sensível no atual debate político brasileiro. Depois que o TSE remeteu dezenas de convites para instituições estrangeiras acompanharem o pleito, em outubro, o Itamaraty reclamou do convite à União Europeia, e o TSE teve de recuar. Bolsonaro também disparou críticas públicas à presença dos observadores, que acompanham eleições brasileiras ao menos desde 1994.
Brasil e EUA vivem uma “recalibragem” de suas relações, depois do mal-estar causado nos americanos pela visita do presidente brasileiro a Moscou em fevereiro, dias antes de o líder russo Vladimir Putin ordenar a invasão da vizinha Ucrânia. Entre diplomatas brasileiros existe a expectativa de que Bolsonaro e Biden se falem pela primeira vez pessoalmente em Los Angeles (EUA), em junho, durante a Cúpula das Américas.