Ainda perplexo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, num gesto sem precedentes e de inusitada coragem, ordenou a prisão do senador do PT e líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral, o brasileiro comum vibrou com o renascer da esperança que se esvaíra com a chegada dos garantistas da impunidade nessa Suprema Corte.
Delcídio foi flagrado numa gravação programando a liberdade e a fuga do ex-diretor da Petrobrás, Nestor Ceveró, com a suposta ajuda dos ministros do STF, entre os quais Teori Zavascki, Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Com os dois primeiros o próprio Delcídio já teria falado; com o ministro Gilmar, o interlocutor seria o vice-presidente Michel Temer. Para completar, Delcídio diz a seu chefe de gabinete para anotar em sua agenda o compromisso de “tomar um café” com o ministro Edson Fachin, também do STF.
A surpresa, no entanto, não foi pela unanimidade da decisão de ordenar a prisão de Delcídio, mas sim pelo fato de que quem propôs a ordem foi justamente o relator do processo, Teori Zavascki, um dos prediletos do PT. Sim, porque antes desse acontecimento, Zavascki já havia concedido uma liminar revogando a prisão de Renato Duque, ex-diretor de serviços da Petrobrás e arrecadador de propinas para o partido. Ligado a Zé Dirceu, Duque tinha como subordinado Pedro Baruch, que prometeu devolver 97 milhões de dólares roubados da estatal. Por ocasião da liminar, a única medida que Zavascki tomou contra Duque foi mandar recolher o seu passaporte.
Posteriormente, Zavascki e seu colega, Luís Roberto Barroso, abriram caminho para anular a condenação de muitos mensaleiros, entre os quais José Genoíno – elogiado por Barroso -, o próprio Dirceu e Delúbio Soares. Esses dois ministros eram, até a prisão de Delcídio, a esperança do PT, mais até do que o notório Ricardo Lewandowski, considerado petista de carteirinha.
Foi Zavascki quem mandou soltar o executivo da Odebrecht Alexandrino Salles de Alencar, preso por suspeita de participação no esquema de corrupção na Petrobrás. Mandou soltar, também, 12 presos pela Lava Jato, entre eles o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da estatal, Paulo Roberto Costa, além de determinar a suspensão dos inquéritos referentes às investigações e a remessa dos autos para o STF.
Por ocasião da soltura de Ricardo Pessoa, dono da UTC, os votos favoráveis foram de Teori Zavascki, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, justamente os três citados por Delcídio. Os votos contrários foram dos ministros Celso de Mello e Carmen Lúcia. O povo tem muito respeito por esses dois, em especial pela ministra, mineira de Montes Claros, uma honra para a Suprema Corte.
É dela a afirmação de que houve um momento em que nós acreditamos que a esperança tinha vencido o medo. Depois, o cinismo venceu a esperança. Agora, o escárnio venceu o cinismo, “mas o crime não vencerá a Justiça nem os criminosos passarão sobre os juízes nem sobre a Constituição”. Sua excelência parece ter esquecido que os poderosos têm imunidade e foro privilegiado, e, como disse o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Rodrigo Collaço, “O foro privilegiado é acima de tudo o foro da impunidade. Não há julgamento”. Joubert dizia que a justiça sem força e a força sem justiça são duas desgraças terríveis”. E a ministra sabe que nossa justiça não tem força. Eles passarão.
*Luiz Holanda é advogado e professor universitário.
Seja o primeiro a comentar