

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou na noite desta segunda-feira (13/05/2013) do debate de lançamento do livro ’10 anos de governos pós-neoliberais no Brasil – Lula e Dilma’. Em sua fala, Lula disse que o maior legado que deixou em sua presidência não foi nenhum dos programas sociais de êxito, mas sim ter mostrado que é possível “governar de forma republicana sem aqueles que me odiavam”. Para o ex-presidente, “o palácio, que até então era para reis e rainhas, banqueiros e grandes empresários, continuou sendo. Mas com uma diferença: é que lá entravam também os índios, os hansenianos, os moradores de rua, os favelados, fazendo com que, pela primeira vez, aquela fosse uma casa de todos e não apenas de uma parcela da população brasileira”.
Lula participou do debate com o economista Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, da filósofa Marilena Chauí e do sociólogo e organizador do livro, Emir Sader.
O ex-presidente lembrou das 74 conferências nacionais que fez, “sobre todos os temas que vocês possam imaginar. E eu ia lá para ouvir mais do que falar”. Nessas conferências, Lula abriu as portas do planalto para catadores de recicláveis, de hansenianos, para deficientes visuais acompanhados de cães-guia, e para os sem-teto, entre outros.
Sobre as críticas que recebeu desde o início de seu governo, Lula foi direto: “eu tinha consciência que meu problema com parte da elite política desse país e da elite da imprensa brasileira era meu sucesso. Se eu fracassasse, eles falariam bem de mim: ‘coitadinho do operário. Coitadinho chegou lá, mas não tem culpa, não tava preparado, não fez nossa escola’.”
Lula provou que não era preciso esperar o bolo crescer para depois dividir
O economista e atual presidente da Fundação Perseu Abramo lembrou de mudanças estruturais pelas quais o Brasil passou. E fez um mea-culpa em nome dos economistas, que apostaram durante décadas que era preciso primeiro crescer para depois dividir o bolo, ideia que Lula provou estar errada. “Em 1980, o Brasil era a oitava economia do mundo, enquanto um em cada dois brasileiros vivia em condição de miséria”, lembrou. “No ano 2000, já tínhamos caído para a 13ª posição entre as maiores economias do mundo, atrás do México na América Latina, tínhamos 11 milhões de desempregados”, disse, enquanto lembrou que o Brasil vive situação próxima ao pleno emprego atualmente.
Mudanças que não foram conquistadas nem com 60 anos de movimento feminista
A professora Marilena Chauí citou o Bolsa Família, o Prouni e a criação de uma nova classe trabalhadora no Brasil como exemplos da transformação que o Brasil viveu. Para Marilena Chauí, “o efeito do Bolsa Família para as mulheres, conseguiu alterar o conceito e o modo de operação da família de um jeito que seis décadas de feminismo não conseguiram”. No programa Bolsa Família, é a mulher quem recebe o cartão com o benefício, e ela tem autonomia para escolher como gastá-lo. A professora diz ainda que o criticado Prouni, ao lado do Enem e das cotas estão preparando uma revolução na educação brasileira no longo prazo, ao serem capazes de acabar com a indústria do vestibular e provocar uma reestruturação do ensino. Por fim, ela lembrou que o Brasil tem agora não uma nova classe média, mas uma nova classe trabalhadora como sujeito político de comportamento bastante diferente da classe média tradicional.
O livro
Essencialmente uma reflexão sobre os rumos da política brasileira na última década, o livro ofereçe um panorama dos desafios enfrentados pelo País. Além de trazer uma rara e inédita entrevista com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a obra reúne 21 artigos de alguns dos principais intelectuais engajados e ativamente envolvidos na política dos últimos anos.
Como avaliar as enormes transformações pelas quais o Brasil passou ao longo da última década? O país foi palco de profundas mudanças desde que elegeu o Partido dos Trabalhadores. Compreender e refletir o seu legado tornou-se uma tarefa incontornável para pensar os rumos do País. Coeditado pela Boitempo e pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais sede Brasil (Flacso Brasil), o e-book do livro estará disponível para download gratuito a partir da segunda quinzena de maio.
10 anos de governos pós-neoliberais no Brasil, coletânea organizada pelo sociólogo Emir Sader, contribui para essa difícil empreitada, com reflexões de alguns dos mais destacados pensadores brasileiros, como Marilena Chauí, Marco Aurélio Garcia, Marcio Pochmann, Luiz Gonzaga Belluzzo, José Luis Fiori, Luis Pinguelli Rosa e Paulo Vannuchi.
Sader não hesita em expor as tensões em meio às quais se desenvolveu a política econômica do governo, da primeira à segunda – e atual – fase. O resultado é um panorama de 21 ensaios de intelectuais engajados e ativamente envolvidos na política da última década, que discorrem sobre como foram implementadas as políticas sociais – o cerne dos governos Lula e Dilma –, seus enfoques setoriais obrigatoriamente desiguais, seus sucessos e obstáculos até hoje ainda não superados. Além desse amplo espectro de reflexões, o livro conta com uma entrevista inédita com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, realizada em fevereiro de 2013 especialmente para esta coletânea, na qual ele avalia a experiência de governo e faz um balanço das suas realizações e do que não foi possível fazer durante seus dois mandatos. “A intuição e o pragmatismo de Lula serviram de bússola nesse caminho, com situações às vezes surpreendentes e inesperadas, mas que fizeram com que se concluísse esse período com um balanço claramente positivo”, afirma o sociólogo.
O livro é considerado por Sader um instrumento de atualização da prática política e de reflexão necessária para a superação definitiva do neoliberalismo no Brasil. A rubrica “pós-neoliberal” visa dar conta da totalidade das políticas antineoliberais que emergiram no marco das grandes recessões que abalaram a América Latina no final do século XX. A perspectiva essencial é de que o esgotamento do modelo neoliberal não foi sucedido por um modelo alternativo que pudesse substituí-lo em escala global. “Vivemos e seguiremos vivendo ainda por um tempo prolongado um período turbulento, nos planos geopolítico e econômico-financeiro, de disputa hegemônica, em que um mundo velho insiste em sobreviver e um mundo novo encontra dificuldades para se afirmar”, avalia Sader no ensaio “A constituição da hegemonia pós-neoliberal”.
A década que teve fim em 2002 combinou várias formas de retrocesso. Entre elas, a prioridade do ajuste fiscal, as correspondentes quebras da economia e as cartas de intenção do FMI, que desembocaram na profunda e prolongada recessão que o governo Lula herdou. Os caminhos pelos quais os governos Lula e Dilma trilharam e ainda trilham para enfrentar essa herança foram mais complexos e conflituosos do que se poderia esperar. No entanto, Maria Inês Nassif afirma no texto de orelha que, na última década, o Brasil percorreu tão rapidamente caminhos desconhecidos em sua história que ainda não se deu conta de que uma nova geração já perdeu a referência do passado. “O debate é fundamental para o futuro”, assinala. Para Nassif e Sader, o livro é uma proposta para o aprofundamento das discussões sobre os governos Lula e Dilma pela óptica progressista e pela perspectiva da continuidade. “São 10 anos que servem de pano de fundo para se pensar sobre a herança recebida, as transformações logradas e aquelas não realizadas, com suas razões e consequências, e as projeções do futuro brasileiro”, conclui Sader.
Trecho do livro
“Fragmentada, perpassada pelo individualismo competitivo, desprovida de um referencial social e econômico sólido e claro, a classe média tende a alimentar o imaginário da ordem e da segurança porque, em decorrência de sua fragmentação e de sua instabilidade, seu imaginário é povoado por um sonho e por um pesadelo: seu sonho é tornar-se parte da classe dominante; seu pesadelo é tornar-se proletária. Para que o sonho se realize e o pesadelo não se concretize, é preciso ordem e segurança. Isso torna a classe média ideologicamente conservadora e reacionária, e seu papel social e político é o de assegurar a hegemonia ideológica da classe dominante, fazendo com que essa ideologia, por intermédio da escola, da religião, dos meios de comunicação, se naturalize e se espalhe pelo todo da sociedade. É sob essa perspectiva que se pode dizer que a classe média é a formadora da opinião social e política conservadora e reacionária.”
– Marilena Chauí em “Uma nova classe trabalhadora”
Sumário
ENTREVISTA COM LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
O necessário, o possível e o impossível
Emir Sader e Pablo gentili
GEOPOLÍTICA
O Brasil e seu “entorno estratégico” na primeira década do século XXI
José Luís Fiori
POLÍTICA EXTERNA
Dez anos de política externa
Marco Aurélio Garcia
ECONOMIA
Dez anos de política econômica
Nelson Barbosa
POLÍTICA INDUSTRIAL
Os anos do povo
Luiz Gonzaga Belluzzo
DESENVOLVIMENTISMO
Dez anos depois…
Jorge Mattoso
CIDADANIA E CLASSES SOCIAL
Uma nova classe trabalhadora
Marilena Chaui
PÓS-NEOLIBERALISMO
A construção da hegemonia pós-neoliberal
Emir Sader
POLÍTICAS SOCIAIS
Políticas públicas e situação social na primeira década do século XXI
Marcio Pochmann
DESENVOLVIMENTISMO REGIONAL
Desenvolvimento regional brasileiro e políticas públicas federais no governo Lula
Tania Bacelar de Araujo
ENERGIA
Energia e o setor elétrico nos governos Lula e Dilma
Luiz Pinguelli Rosa
REFORMA AGRÁRIA
A reforma agrária que o governo Lula fez e a que pode ser feita
Bernardo Mançano Fernandes
COMUNICAÇÃO
Por que não se avança nas comunicações?
Venício A. de Lima
MEIO AMBIENTE
A política ambiental na década 2002-2012
Liszt Vieira e Renato Cader
SAÚDE
Saúde é desenvolvimento
Ana Maria Costa
EDUCAÇÃO
A procura da igualdade: dez anos de política educacional no Brasil
Pablo Gentili e Dalila Andrade Oliveira
CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO
Uma década de avanço em ciência, tecnologia e inovação no Brasil
Sérgio Rezende
CULTURA
Cultura: políticas públicas e novas visibilidades
Glauber Piva
TRABALHO
Um olhar dos trabalhadores: um balanço positivo, uma disputa cotidiana e muitos desafios pela frente
Artur Henrique
POLÍTICA PARA AS MULHERES
10 anos de política para as mulheres: avanços e desafios
Eleonora Menicucci de Oliveira
DIREITOS HUMANOS
Direitos humanos e o fim do esquecimento
Paulo Vannuchi
IGUALDADE RACIAL
Dez anos de promoção da igualdade racial: balanços e desafios
Renato Ferreira
Sobre os autores
Luiz Inácio Lula da Silva foi presidente da República de 2003 a 2010. Ex-sindicalista, com papel de liderança nos protestos contra a ditadura militar, é um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores, do qual é presidente honorário.
José Luís Fiori é professor titular de economia política internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É autor de Poder global e a nova geopolítica as nações (2007) e Ontem, hoje e amanhã: tendências do sistema mundial (no prelo), ambos pela Boitempo.
Marco Aurélio Garcia é assessor especial de Política Externa da presidenta Dilma Rousseff, função que desempenhou nos dois governos de Luiz Inácio Lula da Silva. É professor aposentado de História, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Nelson Barbosa é professor do Instituto de Economia da UFRJ e secretário executivo do Ministério da Fazenda.
Luiz Gonzaga Belluzzo é professor de Economia da Unicamp. Atuou como consultor pessoal de economia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Escreveu com Júlio Sérgio Gomes de Almeida, Depois da queda: a economia brasileira da dívida aos impasses do real (Civilização Brasileira, 2002).
Jorge Mattoso é economista e consultor. Foi presidente da Caixa Econômica Federal (2003-2006) e atua como secretário de finanças da Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo desde 2009.
Marilena Chaui é professora de Filosofia na Universidade de São Paulo (USP) e autora, entre outros livros, de Iniciação à filosofia (Ática, 2012) e Cidadania cultural (Perseu Abramo, 2006).
Emir Sader foi secretário-executivo do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso). Organizou ao lado de Ivana Jinkings, Carlos Eduardo Martins e Rodrigo Nobile a Latinoamericana: enciclopédia contemporânea da América Latina e do Caribe (Boitempo, 2006).
Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia da Unicamp. Pela Boitempo, publicou O emprego na globalização (2001), O emprego no desenvolvimento da nação (2008) e Nova classe média? (2012).
Tania Bacelar de Araujo é professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e especialista em desenvolvimento regional. É autora de Ensaios sobre o desenvolvimento brasileiro: heranças e urgências (Revan, 2000).
Luiz Pinguelli Rosa é diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (UFRJ). Membro da Academia Brasileira de Ciências, foi presidente da Eletrobras de 2003 a 2004.
Bernardo Mançano Fernandes é professor de Geografia na Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Presidente Prudente e coordenador do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos da Reforma Agrária na mesma universidade.
Venício A. de Lima é professor de Ciência Política e Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), fundador e primeiro coordenador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da mesma universidade.
Liszt Vieira é doutor em Sociologia pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) e professor da Pontífica Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC- Rio).
Renato Cader é doutor em Ambiente e Sociedade pela Unicamp e docente da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Ana Maria Costa é médica sanitarista, doutora em Ciências da Saúde e presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes).
Pablo Gentili é secretário executivo do Clacso, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e diretor da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso-Brasil).
Dalila Andrade Oliveira é presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Sergio Machado Rezende é professor de Física da UFPE. Foi ministro da Ciência e Tecnologia no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. É autor de Materiais e dispositivos eletrônicos (Livraria da Física, 2004).
Glauber Piva é sociólogo e foi diretor da Agência Nacional de Cinema (Ancine). Foi professor de Políticas Culturais, Corpo e Diversidade na Faculdade de Artes de Paraná.
Artur Henrique é sociólogo e ex-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT). É conselheiro do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) e diretor financeiro da Fundação Perseu Abramo na gestão 2012-2016.
Eleonora Menicucci de Oliveira é socióloga e ministra-chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres. É professora em Saúde Coletiva da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Paulo Vannuchi é jornalista. Foi ministro-chefe da Secretaria de Direitos Humanos de 2005 a 2010. Trabalhou na elaboração de Brasil nunca mais, coordenado por dom Paulo Evaristo Arns.
Renato Ferreira é advogado e professor de Direitos Humanos. Mestre em Políticas Públicas pela Uerj. Foi assessor da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República.
Estrutura da publicação
Título: 10 anos de governos pós-neoliberais no Brasil
Subtítulo: Lula e Dilma
Autor(a): Emir Sader (org.)
Prefácio: /Orelha: Maria Inês Nassif
Páginas: 384
Ano de publicação: 2013
ISBN: 978-85-7559-328-8
