Na minha humilde infância, início dos anos 1970, a diversão da meninada nas segundas-feiras era assistir a estreia cinematográfica do Cine Roma, ali na Península Itapagipana.
Após o estrondoso sucesso em Operação Dragão, o tranquilo e infalível Bruce Lee tinha inaugurado um marcante e vulgar gênero cinematográfico chamado “filmes de kung fu”, que aos poucos foi desbancando os “filmes de cauboi” de gerações anteriores — gênero hoje relegado a saudosas memórias, ou enobrecido como “cult”.
Em alegre algazarra saíamos da Rua da Palestina, frente da nossa casa e do vizinho Pedrinho Torres que, como garoto mais velho da turma, era também o líder daquela meninada, e responsável pelos garotos menores — entre os quais este que vos escreve — quando o meu irmão mais velho não estava presente.
Meu outro irmão, o segundo, até hoje não se conforma de ter ficado de fora destas matinês, pois era obrigado a dar plantão no modesto comércio de bairro do nosso pai, seu Vavá.
Como era sessão dupla, para aproveitamento do ingresso assistíamos também ao longo e tedioso segundo filme da tarde e, ao final, em alegre e ordeira algazarra voltávamos para casa, excitados com os golpes de kung fu recém-aprendidos. Eu e o irmão mais velho íamos exercitá-los até a exaustão na laje da casa suburbana, reproduzindo inclusive os urros e gritos dos herois do cinema, o que despertava a atenção de toda a vizinhança sobre aqueles meninos ensandecidos.
O decadente Cine Roma tinha vivido os seus dias de glória nos anos 1950-60 como Cine Teatro, e se tornou lendário por ter sido palco das primeiras apresentações do mito pop que surgia: o cantor Raul Seixas, bandleader da banda de rock “Raulzito e seus Panteras”.
De profano a sagrado
Eis que num sábado de junho de 2011, em peregrinação a Sagrada Colina, eu e minha consorte decidimos visitar e conhecer o novo templo itapagipano, instalado na edificação do antigo Cine Roma da infância: a Igreja da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, belo e espaçoso santuário que tem a honra e o privilégio de abrigar o mausoleu do Anjo Bom da Bahia e do Brasil: a Bem-aventurada Dulce dos Pobres.
Lugar sagrado, local de orações e rogos pela intercessão da caridosa freira aos deserdados filhos de Eva que aqui permanecem gemendo e chorando no vale de lágrimas que é este mundo Terra.
Ao lado do templo encontra-se o Memorial Irmã Dulce, com relíquias da santinha dos baianos e, neste lugar especial e meditativo, acha-se o quarto que era escritório e dormitório da amável freirinha.
Lembro de um outro museu-convento, visitado em Alba de Thormes (Salamanca-Espanha), onde pulsa vivo o incorruptível sagrado coração de Santa Tereza de Ávila, e a cela que a poetisa e mística cristã, doutora da Igreja, passou seus últimos dias até subir aos céus.
Percorremos as salas com a exposição permanente da vida e obra de Irmã Dulce, a serva de Deus que viveu para a caridade e o amor ao próximo, e saímos deste santuário revigorados na nossa fé e esperança em dias melhores.
Não deixem de visitar a Igreja da Imaculada Conceição da Mãe de Deus e o Memorial Irmã Dulce na Avenida Bonfim, 161, Largo de Roma, Salvador – Bahia.
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