
Obras de Angra 3, desativada desde 1986, serão retomadas. Brasil sempre contou com know-how da Alemanha – onde construção de novas usinas nucleares é assunto proibido.
Mais de 40 anos depois de sua concepção original, tudo indica que a terceira usina nuclear brasileira vai ser finalizada. O Diário Oficial da União publicou no início desta semana a licença que autoriza a construção do prédio que vai abrigar o reator de Angra 3.
O governo brasileiro enxerga na nova usina a chance de reduzir os riscos do déficit de energia elétrica. Angra 3 terá capacidade de fornecer 1.405 MW de energia, o que deverá ajudar a abastecer a região sudeste a partir de 2015. A nova planta não está envolta na polêmica que ainda acompanha a usina hidrelétrica de Belo Monte, mas não deixa de ter uma pitada de controvérsia.
Obras de Angra 3, desativada desde 1986, serão retomadas. Brasil sempre contou com know-how da Alemanha – onde construção de novas usinas nucleares é assunto proibido.
As obras em Angra dos Reis aguardam um recomeço desde 1986. Depois da aparente superação da série de dúvidas que interromperam a construção da usina – tais como falta de recursos públicos, custo alto e desconfiança quanto à sua conveniência –, o projeto ainda enfrenta alguns questionamentos externos.
Sala de controle de Angra 2 (em 1998)”Alguns equipamentos antigos já foram entregues e estão lá, esperando para serem usados por anos e anos. Recomeçar esse projeto é realmente um caso de segurança. A história mostra que recomeçar projetos antigos sempre traz à tona problemas relacionados a custo e tempo”, observa Heinz Smital, especialista em energia nuclear do Greenpeace na Alemanha. De fato, a decisão de se construirem as três usinas nucleares na cidade de Angra dos Reis foi tomada pelo governo em 1968. As obras de Angra 1 começaram em 1970 e a usina foi conectada ao sistema somente em 1982 para, três anos depois, começar a fornecer eletricidade comercialmente.
A segunda usina entrou em operação em 2001, enquanto as obras de Angra 3, naquela época, já estavam paralisadas há cinco anos. Foi só em 2007 que o governo resolver retomar o projeto com vigor.
“Em 20 anos, foram muitas as mudanças de design de usinas nucleares. Algumas foram adaptadas, outras não. Angra 3 é um caso único na história. Há muitos problemas escondidos na complexidade dessa construção”, avalia Heinz, que acompanha a discussão brasileira.
No entanto, a empresa Eletrobrás assegura que os equipamentos antigos adquiridos estão em “ótimas condições para uma operação confiável e segura da planta”. E que eles “apresentam os mesmos projetos de engenharia e os mesmos métodos fabris e construtivos que aqueles em operação nas usinas alemãs mais recentemente construídas – as usinas da série Konvoi, que, desde o início do funcionamento comercial, vêm se colocando entre as usinas nucleares de melhor desempenho operacional no mundo”.
A última usina nuclear construída na Alemanha data de 1989. Os reatores do tipo Konvoi são usados em cinco nas usinas alemãs nas localidades de Neckarwestheim, Isar e Emsland, segundo dados da produtora.
Painel de energia fotovoltaica em Freiburg, na Alemanha na contracorrente Enquanto cresce a aposta no uso das energias renováveis como solução limpa para um futuro comprometido pelas mudanças climáticas, o ritmo de construção de usinas nucleares desacelera. Curiosamente, 2008 foi o ano em que o mundo não assistiu à implantação de qualquer nova usina do tipo.
“É muito claro que novas construções de usinas atômicas não são aceitas na Alemanha.
Isso já foi esclarecido pela população e por todos os segmentos da sociedade. Os partidos políticos decidiram que não vão apoiar novas usinas.
A única questão ainda não resolvida é quanto tempo as já existentes irão continuar em operação”, esclarece Heinz Smital, especialista em energia nuclear do Greenpeace na Alemanha. E esse é assunto ainda em andamento no cenário político. Atualmente, 17 reatores estão em funcionamento na Alemanha e o país não apoia o prolongamento da vida útil das usinas. Usina nuclear em Kahl no Meno, AlemanhaRelações alemãs desde o início Se a população alemã se opõe à ideia de aumentar a oferta interna de energia nuclear, é daquele país que vêm os maiores parceiros para a construção das usinas de Angra.
Em 1975, Brasil e Alemanha assinaram um acordo de cooperação na área – os brasileiros passam a ter acesso ao ciclo completo de abastecimento. Naquele mesmo ano, o governo brasileiro adquiriu os dois primeiros reatores da empresa alemã Siemens/KWU.
O projeto de Angra 3 também é Siemens/KWU, atual Areva NP. O investimento em equipamentos já adquiridos é de 600 milhões de euros, mas até 2015 deve chegar a 8,4 bilhões de reais.
O governo Lula ainda trabalha com a proposta, apresentada pelo Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro, de construção de mais quatro usinas nucleares com capacidade de 1.000 MW cada.