Os clientes das poucas mesas ocupadas iam sendo depenados, até os assaltantes chegarem à mesa do nosso ilustre personagem.
Vivemos numa sociedade organizacional, sociedade burocrática. Daí que surge o homo burocraticus, aquele que nasce, cresce e um dia vai morrer dentro do quadro de organizações formais.
Algumas burocracias são tão frias e impessoais que substituem o nome por um número, despersonalizando o indivíduo. Instituições educacionais que assim procedem não deixam de criar constrangimentos.
Professor: aluno vinte e três?
Aluno: Presente!
– Aluno vinte e quatro…
– …
– Vinte e quatro!
– …
E olhe lá o 24 se escondendo.
Acompanha a organização burocrática o outro lado da moeda: Dona Burocracia, gorda… lenta… paquidérmica, diríamos, e ineficaz. Por essas e tantas o homo burocraticus se coloca em situações de alto risco para preservar os seus direitos burocráticos.
Como direito burocrático fundamental existe o de ter documentos escritos. Ai daquele que os percam. Torna-se um zé ninguém, com o perigo de ser incriminado e punido por… falta de documentos.
O preclaro leitor já experimentou cair numa blitz e alegar para o “simpático” policial que esqueceu os documentos em casa? E já perdeu ou teve roubado o seu passaporte em lugar estranho, distante dos Consulados Gerais do Brasil? E aqueles outros documentos insubstituíveis, que não basta pedir segunda via?
Ah e se o problema for a falta de comprovantes escritos, o cara está perdido.
Assim que, num certo entardecer na Praia de Itapuã, quando caymmicamente o saudoso economista baiano Luiz Buzón filosofava, embalado pelos eflúvios etílicos e suave brisa nordestina, o bar onde ele perorava sofreu um daqueles fulminantes ataques, comuns à violenta cena soteropolitana, de assalto a mão armada.
Os clientes das poucas mesas ocupadas iam sendo depenados, até os assaltantes chegarem à mesa do nosso ilustre personagem. Ao ser surpreendido violentamente pelos meliantes, que anunciavam o assalto de armas em punho, Luiz Buzón ainda teve a audácia de bradar:
– Levem tudo. Mas os documentos eu não dou!
Foram suas últimas corajosas palavras, antes de desmoronar desmaiado por forte coronhada na nuca.
Preservar a vida e a saúde pouco importava para o nosso bravio herói. Importante mesmo eram os seus documentos…
Assim é o homo burocraticus.
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